quarta-feira, 4 de julho de 2012

Nem Sempre Bom!

A angústia que nos assola quando, pelos mais diversos motivos, tivemos que emigrar para um distante e destinto destino, é e será uma experiência que para sempre mudará a nossa visão do mundo.

Estou farto das milhentas conversas sobre as oportunidades que Moçambique tem para nos oferecer e a garantia de um sucesso profissional como nunca seria possível em Portugal. De que me vale isso quando tenho, todos os dias que lidar com a minha própria desilusão e a angústia de sentir que tudo o que digo é, ou mal interpretado, ou simplesmente não entendido!

Moçambique tem um longo caminho para percorrer no que se refere à qualificação dos seus cidadãos, e não me refiro apenas à qualificação académica e/ou profissional, mas especialmente à qualificação como seres activos e capazes de desempenhar a mais básicas das tarefas sem por em causa todo o processo, como cidadãos participantes e preocupados com o desenvolvimento da sua própria cidadania e com o seu país. O que assisto é a uma quantidade de pessoas dispersas pelas ruas, cada uma deixada ao seu próprio destino, subjugadas ao infortúnio de não terem tido qualquer igualdade de oportunidades, nem sequer a oportunidade de aprender e de se formarem como cidadãos. Em contrapartida há uma classe completamente distante desta realidade, ainda que originaria de uma sorte igual, que, por um qualquer motivo de sorte do acaso, ou por esperteza maquiavélica, conseguiu tornar-se no que já me habituei a chamar de, classe média instantânea, que goza de uma especial crueldade para com os seus próprios conterrâneos e provavelmente camaradas de luta. Esta classe média instantânea é o ponto de partida para um Moçambique mais desigual e distante dos objectivos traçados pelo governo Moçambicano para a diminuição da pobreza e para o desenvolvimento do país.

O tratamento menos correto para com outro ser humano, não está unicamente na forma de nos dirigirmos a ele, aliás, esse é um mal menor! A arrogância que um qualquer estrangeiro possa demonstrar perante um Moçambicano, não é mais que a representação de um estado de espírito! Mas a arrogância que permite que os membros desta classe média instantânea, muitos deles com cargos de relevo nas empresas estrangeiras, (muitas vezes sem qualificações para tal) que assistem passivamente à continuidade e prorrogação da miséria em que os seus conterrâneos vivem, permitindo a continuidade do pagamento de salários miseráveis e até tirando partido desse baixo rendimento para seu próprio proveito, deveria ser entendido como algo muito mais ofensivo que qualquer manifestação de superioridade de um estrangeiro que, mais cedo ou mais tarde, retornará ao seu país.

3 comentários:

  1. Em Portugal assisti(infelizmente) a atitudes racistas de perto e nunca fiquei calada, não podemos dizer que são opiniões, essas opiniões fizeram o Holocausto ter as dimensões que teve. Muitas vezes me diziam aqui em Portugal que os negros entre si era muito racistas, não acreditava. Infelizmente vi isso de perto, tudo o que falou e talvez mais, vi negros mulatos a dizerem a negros mais escuros que eles eram brancos e os outros pretos, vi que se gera um elite em torno do tom de pele, vi que não são capazes de se respeitarem de verdade. Enquanto a mim como branca diziam-me que não tinham salário para pagar a uma branca, a um negro já teriam um salário para lhe pagar, mas porque? Não merecíamos os dois o mesmo salário? Mesmo que eu fosse mais qualificada do que ele não seria justo a ele ser pago um salário miserável. O meu marido é negro, há dias disse-me que era o funcionário mais bem pago da empresa dele, claro que trabalha muito, mas falou-me de senhores com 40 e muitos anos a receber pouco mais de 4000 mil meticais, é quase surreal. Infelizmente com estas diferenças sociais eu não vejo a paz que todos dizem, eu vejo uma paz consentida, a Frelimo teme a Renamo e ainda em Dezembro passado a ultima ameaçou começar uma guerra. Esperemos que estas diferenças sociais tão acentuadas desapareçam, para o bem de todos.

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  2. Olá Sofia,
    Obrigado por ter comentado.
    A verdade é que nos dias que correm, o racismo é muito mais que a diferença da cor de pele, e está muito presente em países onde essa diferença não existe.
    uma maior verdade e mais chocante para mim desde que cheguei a Moçambique, é que nós, lá na Europa, somos muito menos Racistas que qualquer Africano, principalmente os portugueses que, ainda que tenhamos sido no passado colonizadores sempre primamos por algum bom senso que não caracterizava nenhum dos outros povos colonizadores.
    Quanto à manutenção da paz em Moçambique, e segundo o que são os dados comparativos de outros países no passado recente, está para ficar, não que não existam diferenças de opinião e vontades individualizadas de fazer a guerra - como sabe o povo Moçambicano é muito Tribal - mas porque está em marcha um ataque económico em grande escala aos recursos naturais Moçambicanos e, como sabemos, se há muito dinheiro envolvido, qualquer um tem o seu preço, seja de uma ou de outra força partidária.
    volte sempre ao meu blog que é para isso que o escrevo.
    Obrigado

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  3. Embora acredite, custa-me ler a realidade que descreve António, mas em que país esta realidade não se verifica, nuns em maior noutros em menor escala?!
    Infelizmente o ser humano não é bondoso por natureza, é egoísta, é racista e maior parte das vezes passa por cima de qualquer um para obter os seus fins, principalmente quando não teve oportunidade de obter “educação”.
    Da educação vem o discernimento, a compaixão, a bondade… não falo só da educação escolar, mas da educação familiar, social que muitos desses moçambicanos não tiveram oportunidade de obter.
    Sinto pena ao saber que nos anos em que os portugueses estiveram em Moçambique não “educaram” o povo, mas sim exploraram, deixando-os depois à mercê de si mesmos.

    Quanto ao racismo, descendo de uma família multi-racial, a minha mãe é portuguesa branca e o meu pai é moçambicano misto: teve um avô chinês e outro português e ambas as avós eram moçambicanas, negras.
    A partir daqui cresceu uma família mista que mais tarde ainda acrescentou a origem indiana.
    Desde muito criança oiço relatos de racismo na minha família, sofridos e demonstrados, sendo o casamento dos meus pais, o história mais viva, mas que ultrapassou as barreiras.
    Tenho também presentes as demonstrações de racismo da minha avó, mista-chinesa, contra os seus conterrâneos negros, senhora que eu respeitava mas que caracterizava a típica sociedade média-alta dos áureos anos que esse país atravessou em tempos.

    Penso que a atitude certa neste momento é de esperança. Vai demorar algum tempo mas de certo as novas gerações moçambicanas irão ter a oportunidade de mudar a sociedade para melhor e é essa a ajuda que pretendo dar ao meu país natal se tiver oportunidade de regressar.

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